sexta-feira, janeiro 29

Suor


O tempo pouco importa: chova ou faça sol, frio ou calor, quem sofre de hiperidrose tem sempre a sensação de estar banhado de suor. A sensação é constante, incontrolável e traz enormes constrangimentos — como o receio de andar de mãos dadas ou de tirar os sapatos e as tentativas, quase sempre malsucedidas, de esconder as marcas de suor nas roupas. O mal acomete de 0,7% a 1,5% da população mundial, entre homens e mulheres em todas as fases da vida, e pode ser controlado com cirurgia ou com aplicações de toxina botulínica.

As causas da hiperidrose permanecem pouco conhecidas. Sabe-se apenas que o mal é resultado de hiperatividade nas glândulas sudoríparas, estruturas neste caso superestimuladas devido a uma anormalidade de provável origem genética no sistema nervoso simpático. Segundo o dermatologista Gilvan Alves, as glândulas sudoríparas dos que sofrem de hiperidrose liberam incansavelmente uma substância chamada acetilcolina. “É como se a glândula levasse um pequeno choque continuamente”, explica. Ainda que não sejam decisivos para a manifestação da hiperidrose, “os exercícios, a temperatura local e a ansiedade podem influenciar na quantidade de suor, intensificando o quadro de sudorese, diz Gilvan.

A doença pode ser classificada como primária (ou essencial) — desencadeada em geral na infância e intensificada na adolescência— ou secundária, quando fruto de tumores, lesões, hipertireoidismo ou de distúrbios psiquiátricos, entre outros. As áreas mais afetadas são as mãos, as axilas, os pés e o rosto, mas a disfunção pode acometer também outras partes do corpo.

O cirurgião torácico Flávio Brito Filho lembra que os desconfortos causados pela hiperidrose comprometem a vida pessoal, afetiva e profissional dos pacientes. “Quando há hiperidrose nas mãos, por exemplo, o transtorno profissional é enorme, pois a pessoa mal consegue escrever.”

Flávio explica que a cirurgia é o único tratamento definitivo: atualmente, é realizada a simpatectomia torácica videotoracoscópica, procedimento pouco invasivo que bloqueia a hiperestimulação do sistema nervoso simpático, para eliminar a hiperidrose das mãos, axilas, face e pescoço. “Trabalhamos por meio de duas incisões de 0,5cm a 0,7cm no tórax, uma em cada lado do corpo”, resume. A interrupção da mensagem exagerada do nervo simpático pode ser feita por instrumentos cirúrgicos, por termoablação — corte do nervo usando uma fonte de calor — ou pelo bloqueio dessa estrutura com um clip de titânio. A opção do tipo de técnica é do cirurgião. Os resultados obtidos são similares, mas a região do nervo a ser tratada é variável e depende da área na qual a hiperidrose se manifesta.

A cirurgia requer anestesia geral, mas é considerada segura pelos cirurgiões. Entre os possíveis efeitos colaterais há a hiperidrose compensatória — ou sudorese reflexa —, um aumento de suor em outras partes do corpo que antes não apresentavam o problema. “Ainda que moderada se comparada ao problema relatado antes da cirurgia, a hiperidrose compensatória pode ocorrer em até 55% das pessoas operadas”, revela Flávio. “O problema acomete gravemente cerca de 3% dos operados, e o desconforto pode ressurgir em locais como as costas, o abdômen, as pernas ou as coxas.”

O também cirurgião torácico Manoel Ximenes Netto reitera que, antes do procedimento cirúrgico, é essencial uma longa conversa com o paciente. É preciso levantar o histórico para avaliar se a hiperidrose é primária ou secundária; neste segundo caso, o tratamento indicado não é a simpatectomia. “Quando a técnica usada é a clipagem do nervo, podemos reverter a cirurgia caso ocorram efeitos colaterais severos, mas, quando o nervo sofre uma lesão definitiva, não há como remediar.”

De acordo com o especialista, a simpatectomia lombar, que corrige a hiperidrose nos pés, coxas e virilhas, é normalmente conduzida por cirurgiões gerais. Porém, é preciso observar que, depois de submetidos à simpatectomia torácica, muitos pacientes têm o excesso de suor nos pés amenizados também.

A comerciante Marcela Cardoso Martins, 32 anos, suava muito nas axilas. “A hiperidrose comprometia o meu dia a dia, mas avaliei que meu caso não era cirúrgico e, por isso, recorri à aplicação da toxina botulínica”, justifica. O dermatologista Gilvan Alves pondera que um dos benefícios do botox é o fato de não causar efeitos colaterais. “O tratamento é feito no consultório, dura cerca de seis meses e pode beneficiar quem sofre de hiperidrose nos pés, nas mãos, nas axilas, no rosto e no couro cabeludo”, explica. “Quando os sintomas da doença voltam, fazemos uma nova aplicação.”

A servidora pública Bárbara Rodrigues de Melo, 23 anos, relata uma experiência um pouco diferente. Bárbara era acometida por hiperidrose desde a infância, e o problema a afetava nas mãos, nas axilas, no rosto e nos pés. “Era realmente constrangedor, mas fiz a simpatectomia torácica há dois anos e estou muito feliz com o resultado: o problema nas axilas e nas mãos foi corrigido em 100%”, conta.

A transpiração é um mecanismo fundamental à regulação térmica do corpo, e pode aumentar naturalmente em algumas circunstâncias específicas — no calor, quando se praticam exercícios físicos ou na ocorrência de estímulos psíquicos como o medo ou outras emoções fortes.

A secreção de suor é estimulada pelo sistema nervoso simpático, que faz parte do sistema nervoso autônomo, estrutura que funciona independentemente de nossa vontade. Há dois tipos de glândulas produtoras de suor no organismo humano: as écrinas e as apócrinas. As primeiras estão distribuídas por toda a superfície do corpo, predominando na palma das mãos e na planta dos pés, e produzem secreção sudoral clara e diluída. Já o segundo grupo está presente nas axilas, ao redor dos mamilos e, na mulher, no monte de vênus e nos grandes lábios vaginais, produzindo secreção espessa e de odor característico

Fonte: CORREIO BRASILIENSE – DF (Márcia Neri)

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